Vovó
Nita
Em
minha pequena cidade vivia uma senhora de oitenta anos chamada Anita, mas,
todos a conheciam por - Vovó Nita.
Sua
figura, de presença forte, que nunca passava despercebida, despertava minha
curiosidade. Era dona de um porte soberbo, mas ao mesmo tempo transpirava ternura,
e essa dualidade me intrigava. Era um misto de força e ao mesmo tempo de amor.
Sempre
que podia gostava de parar frente à varanda do casarão onde ela morava para um
dedo de prosa. Eu amava estes momentos. Vovó Nita sempre tinha alguma coisa a
me ensinar através de suas sábias palavras.
Apesar
da idade avançada fazia questão de morar na casa onde havia habitado quase que
a vida toda. Não aceitava sair dali para morara com nenhum de seus filhos.
Era
uma espécie de matriarca, pois havia criado seus dez filhos, praticamente
sozinha. Seu marido falecera quando seu caçula era ainda um bebê.
Um
dia ao acordar encontrara o esposo inerte ao seu lado. Deve ter acontecido
durante o sono, pois não percebeu nada de diferente. Não se conformava, pois, acreditem,
despertava ao simples espirro ou resmungo de alguma das crianças.
A
jovem senhora, que até aquele momento havia levado uma vida de rainha, sempre fora
rodeada de empregadas e damas de companhia, se viu de um momento para o outro
sem o chão debaixo de seus pés.
Num
átimo teve de se transformar em mãe e pai para seus filhos.
Sem
nunca ter se preocupado de onde vinha o dinheiro que sustentava a casa e todos
seus luxos, teve de tomar consciência do fato e rapidamente se transformar em
dirigente de todos os negócios da família.
No
início um irmão de seu falecido esposo se prontificou a colocá-la a par de como
deveria agir no gerenciamento do armazém e da fábrica de biscoitos.
Desta
forma dona Anita que sempre teve fartura e conforto, teve de se transformar em
homem da casa.
As
pessoas que a conheceram nesta fase conturbada de sua vida, dizem, que ela
chegava a carregar sacos de 60 quilos nas costas, para as carroças e caminhões
de fazendeiros que compravam mantimentos em seu armazém.
Apesar
de sua beleza, e de muitos cortejadores, não se interessou por nenhum deles,
continuou viúva cuidando de sua família e dos empreendimentos deixados pelo
marido.
Tornou-se
uma mulher firme e decidida, conseguiu gerenciar muito bem os todos os negócios.
O
armazém com o passar dos anos transformou-se em uma rede de supermercados.
A
fábrica hoje é uma grande indústria de bolachas, doces, pães, biscoitos e
balas.
Quem
gerencia os negócios atualmente são seus filhos, e netos, mas sempre sob a sua supervisão.
Não largou totalmente o domínio de seu império.
Mas
o que eu mais amo é ver todas as tardes esta fantástica senhora se embalando
calmamente em sua cadeira de vime.
Com
os olhos fixos no horizonte deixa-se inundar pela beleza de mais um por do sol
que aos poucos se deita, cobrindo o céu com todas as cores do arco-íris. Aos
poucos o manto da noite começa a cobrir toda a paisagem, dando início a
aparição de miríades de lantejoulas que enfeitam o tapete por onde a princesa
Lua irá caminhar até o raiar de um novo dia.
O
que guardo comigo, como se fosse a imagem de uma velha foto, é a figura de uma
rainha cansada, sentada em seu trono a espera de um ocaso que parece se
aproximar aos poucos em sua vida.
Vovó
Nita, sentada em sua varanda tendo ao fundo as cores vibrantes do por do sol,
trazem até mim as mesmas emoções que sinto quando me coloco frente a um quadro
de Vincent Van Gogh.
De
vovó emanam fortes energias e vibrações tão fortes, que a transformo em minha
mente, em mais uma nova obra do famoso mestre, que colocou em suas telas não só
as cores vibrantes, mas também sua alma, e seu coração.
É
assim que me recordo de Vovó Nita: Uma obra de arte pintada por Van Gogh que
consigo apreciar apenas ao fechar dos olhos.
Ela
faz parte de minhas memórias.
Maria
(Nilza) de Campos Lepre. 25/04/2014
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