Amigos
ribeirinhos.
Em
minhas andanças de pesca pelo pantanal de Mato Grosso do Sul, conheci uma
família muito peculiar.
Eram
migrantes nordestinos que se fixaram ali há muitos anos. Acabaram assimilando
os costumes das pessoas da região.
A
casa onde moravam era construída sobre palafitas, na riba mais alta do rio
Miranda, naquela região.
Na
frente havia um pequeno salão com um grande freezer, onde armazenavam os peixes
que seus filhos pescavam. Alugavam espaço nele para que outros pescadores
vizinhos também pudessem conservar os seus peixes, que ficavam ali a espera dos
caminhões frigoríficos que vinham de São Paulo todo final de semana. Só então
vendiam o seu produto.
Dona
Amália, era a cabeça da família. Era ela quem negociava o valor dos pescados e
sempre conseguia um bom preço por eles.
Amália
era uma senhora de estatura mediana, meio roliça, mas muito ativa. Trazia os
longos cabelos que começavam a ficarem grisalhos, presos na nuca numa forma de
coque. Pertencia a uma igreja evangélica e dividia tudo que ganhava como dizimo
com seu Pastor.
Não
me recordo de vê-la parada, estava sempre frente a algum afazer. Mãe de muitos
filhos e ainda procriando, apesar de já ter alguns netos, e o seu caçula ter
apenas três anos de idade. Ela cuidava da casa, dos filhos, da tralha de pesca,
e ainda cozinhava para que não faltasse sustento a sua família – como dizia
ela.
Na
parte da tarde aproveitava para salgar alguns peixes para estocar na despensa
para a época da piracema, quando a pesca é proibida.
Era
ela também quem no final de um dia de pesca, limpava os peixes e os pesava
antes deles irem para o congelador. Embalava-os e colocava o nome de quem havia
pescado. Contava apenas com a ajuda de uma filha, os homens só se dedicavam a
pesca, o resto era com as duas.
Eu
sempre achei aquela situação desumana, mas, não podia me intrometer na vida
deles, principalmente porque nesta região as desavenças costumavam ser
resolvidas - no tiro, na bala como eles diziam.
Em
contrapartida, seu esposo, estava sempre deitado em uma rede que ficava na área
dos fundos da casa, que dava vistas para o rio. Dizia ele que ficava a
inspecionar a saída e a chegada dos barcos de seus filhos. Não tinha aparência
de doente, pelo contrario, irradiava saúde por todos os poros. Entretanto a
família toda o tratava como um inválido, até hoje não consigo entender o porquê
da atitude deles. Mas, convenhamos, nunca tive a coragem de perguntar nada somente
fiquei na observação.
Seu
Gesu, como era chamado por todos, trazia sempre na mão uma espécie de chicote
feito com cordas desfiadas e amarradas numa das pontas para servirem de cabo.
Passava o dia matando ou espantando mosquitos e pernilongos que se atreviam a
chegar perto dele com esse apetrecho. Os dias passavam e ele continuava se embalando
e admirando as águas do rio Miranda passarem por debaixo dele.
Durante
todos os anos em que freqüentei aquela região, jamais o vi sair da rede a não
ser para comer, ir à igreja ou dormir. Mas, era um observador atento do
comportamento do rio, e das nuvens, quando dizia para não irmos muito longe o
obedecíamos, pois sempre sabia qual seria o comportamento das águas ou do céu.
Quando dizia que ia chover ou ia ter temporais, sempre acertava.
Não
sei por que, mas das ultimas vezes que estive por aquela região, não mais os
encontrei, haviam se mudado para a cidade de Corumbá, onde uma de suas filhas
morava desde que se casara.
Às
vezes encontrava com algum de seus filhos na cidade de Miranda, mas nunca mais
me encontrei com o casal.
Guardei
comigo em minhas lembranças a forma tão peculiar de vida daquela família, tão
simples, tão diferente do meu modo de vida, mas, sem duvida nenhuma muito unida
e feliz.
Dentro
das regras que estabeleceram, eram as pessoas mais felizes com as quais tive o
ensejo de conviver.
Hoje
acredito que não importa a forma que vivemos, mas sim como aceitamos as regras
que estão a nossa disposição.
Já
notaram que nunca estamos satisfeitos? Que estamos sempre buscando a satisfação
e o prazer onde na maior parte das vezes não conseguiremos alcançar?
A
felicidade não esta onde procuramos, ela já se encontra aqui a nosso lado, nós
é que somos cegos e não conseguimos agarrá-la.
Saudades
desta época de minha vida, mas sei que já passou. Agora estou vivendo novos
momentos, que também são muito importantes para mim.
Maria
(Nilza) de Campos Lepre – 27/04/2014
Como é bom visitar nossas memórias...
ResponderExcluirBeijão, Nilza!
Em divina amizade.
Sonia Guzzi